TEORIA DOS FREIOS E CONTRAPESOS

(checks and balances)

 

1.  Preâmbulo

As bases iniciais da teoria da tripartição dos poderes foram traçadas ainda na Grécia antiga, por Aristóteles, em sua obra Política. Naquele ensaio o pensador grego imaginava três funções distintas exercidas pelo poder Soberano, a saber: (1) a função de editar normais gerais, (2) a função de aplicar as referidas normas e (3) a função de julgamento, no caso da aplicação da norma em fato concreto, conforme magistério de Pedro Lenza (2010, p.397).

Em vista do contexto histórico de Aristóteles, o exercício das três funções, acima referidas, se concentrava numa única pessoa, ou seja, no Soberano, o qual detinha toda a concentração do poder, o que levou à construção da célebre frase1: “O Estado sou eu”. Era o tempo do sistema absolutista.

Em O Espírito das Leis, o filósofo francês Montesquieu aproveitaria as ideias precursoras de Aristóteles e aperfeiçoaria, digamos assim, aquela teoria da tripartição de poderes. Cada função seria agora exercida por um determinado poder, distinto, autônomo e independente. Era o fim do absolutismo, concentração do poder numa só pessoa, e o advento da divisão orgânica do poder. Tal teoria serviu como base para importantes movimentos, tais como as revoluções americanas, a revolução francesa e, por fim, consagrada na Declaração Francesa dos Direitos do Homem e Cidadão, em seu artigo 16. Assim, essa divisão de poderes, cada qual com sua função típica, deu origem ao que se denominou a teoria dos freios e contrapesos, conforme Pedro Lenza (2010, p. 398).

 

 

 

 

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1 Tal frase é atribuída a Luis XIV, conforme Pedro Lenza, 2010, p. 397.

2.   Teoria de freios e contrapesos (checks and balances)

A separação de poderes - inserida em quase todas as Constituições - e o Estado Democrático são faces da construção teórica conhecida como sistema de freios e contrapesos. Tal teoria considera que os atos praticados pelo Estado são de duas espécies: atos gerais e atos especiais.

Atos gerais são aqueles que só podem ser praticados pelo Poder Legislativo, os quais são regras gerais e abstratas, sem conhecimento prévio a quem vão atingir.

Assim, o Poder Legislativo não intervém concretamente na vida social, não podendo, dessa forma, cometer abusos de poder nem para beneficiar nem para prejudicar pessoa ou grupo de pessoas.

Atos especiais são os atos praticados pelo Poder Executivo que atua após a edição do ato geral pelo Poder Legislativo. O Executivo conta com meios próprios para agir concretamente, mas sua atuação está limitada aos atos gerais praticados pelo outro poder, o Legislativo.

A exorbitância do uso do poder tanto pelo Legislativo quanto pelo Executivo estará sujeita à fiscalização pelo Poder Judiciário, obrigando cada um permanecer na esfera de sua competência.

A engenharia acima descrita corresponde à construção doutrinária conhecida como sistema de freios e contrapesos, conforme Dalmo de Abreu Dallari (1991, p. 184-185).

 

2.1  Aspectos da teoria de freios e contrapesos

A lógica da teoria de freios e contrapesos é baseada na ideia segundo a qual apenas o poder é capaz de limitar o poder. Assim, cada órgão não apenas tem a função de cumprir sua função, mas também a de impedir que o outro abuse de sua competência. Essa ideia, além disso, embute uma preocupação política de proteção da democracia, segundo magistério de Bernardo Gonçalves Fernandes (2011, p. 216).

 

3.   Freios e contrapesos e a Constituição Federal brasileira de 1988

O princípio da separação de poderes – inserido na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 2º, alçado à cláusula pétrea pelo artigo 60, § 4º - resulta da aplicação da teoria dos freios e contrapesos, de modo a definir ao Executivo, ao Legislativo e ao Judiciário (poderes da República) funções típicas de sua natureza, e funções atípicas, as quais permitem a cada poder fiscalizar e limitar a ação dos demais, dentro de um conceito de freios e contrapesos.

Nesse sentido, a função típica do Executivo é a de Chefia de Estado, de Governo e da administração pública, e a função atípica, por sua vez, é de natureza legislativa (medidas provisórias, leis delegadas) e jurisdicional (contencioso administrativo); quanto ao Legislativo, tem-se como função típica legislar e fiscalizar (aspecto contábil, orçamentário, patrimonial e CPIs), como função atípica, a natureza executiva (a sua própria organização) e a jurisdicional (julgamento de crimes de responsabilidade); quanto ao Judiciário, como típica, a função jurisdicional, como atípica, a natureza legislativa (regimentos internos) e executiva (a própria administração).  (Bernardo Gonçalves Fernandes, 2011, p. 216-217).

 

4.   Reflexões finais

O presente estudo abordou a teoria dos freios e contrapesos, a qual teve sua origem na Grécia antiga, com Aristóteles, sendo aperfeiçoada por Montesquieu, passando a figurar em quase todas as constituições, como um sistema limitador do poder.

Por fim, a pesquisa demonstrou que o princípio de separação de poderes – a outra face da teoria de freios e contrapesos - representa importante fundamento na tentativa de evitar o uso despótico do poder, e mais que isso, configura-se em relevante mecanismo de proteção da democracia.

 

 

 

Referências

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1991.

FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de direito constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.